Masculinidade, feminilidade e a liberdade para servir
Por: John Piper
8 Quero, portanto, que os varões orem em todo lugar, levantando mãos santas, sem ira e sem animosidade.
9 Da mesma sorte, que as mulheres, em traje decente, se ataviem com modéstia e bom senso, não com cabeleira frisada e com ouro, ou pérolas, ou vestuário dispendioso,
10 porém com boas obras (como é próprio às mulheres que professam ser piedosas).
11 A mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão.
12 E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio.
13 Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva.
14 E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão.
15 Todavia, será preservada através de sua missão de mãe, se ela permanecer em fé, e amor, e santificação, com bom senso.
O que vimos na última semana em Efésios 5:32 foi que o casamento é um mistério. Deus deu a ele um significado no começo da criação que não foi plenamente revelado por um longo período. Mas que se tornou claro no Novo Testamento. E o mistério é esse: o casamento é uma imagem ou um retrato do relacionamento de Cristo com sua noiva, a Igreja. O marido e a mulher foram destinados por Deus para serem imagens vivas de Cristo e da Igreja no relacionamento um com o outro.
Antes do pecado entrar no mundo
Dessa forma, quando Deus criou o homem e a mulher, ele nos criou da forma como somos – com as diferenças da masculinidade e da feminilidade – para que fôssemos adequados para esses papéis complementares (e para as outras expressões de complementariedade fora do casamento). Nesse drama, o homem foi destinado a cumprir o papel de Cristo, e a mulher foi destinada a cumprir o papel de sua noiva, a Igreja.
E temos salientado por cinco semanas que essas diferenças não são resultado do pecado. O pecado não criou a masculinidade e a feminilidade. Deus criou a distinção. E o pecado não trouxe papéis diversos e complementares à existência. Deus o fez. Antes mesmo de o pecado ter entrado no mundo, Deus ordenou e equipou Adão para ser um líder amoroso, cuidadoso e forte para sua esposa Eva. E antes mesmo do pecado entrar no mundo, Deus ordenou e equipou Eva para ser uma auxiliadora que apoia e honra a liderança de Adão e o ajuda nessa tarefa. Os dois foram feitos à imagem de Deus. Os dois são igualmente semelhantes a Deus. Mas também são diferentes em sua masculinidade e feminilidade. O modelo era belíssimo. Eles respeitavam um ao outro, serviam um ao outro, complementavam um ao outro e desfrutavam um do outro.
O que o pecado arruinou e o que Cristo recuperou
O que o pecado fez foi arruinar essa harmonia. O pecado fez os homens deixarem de serem servos-líderes para se tornarem passivos, severos, insensíveis e sem cuidado ou várias outras distorções da liderança bíblica. E o pecado distorceu o apoio e a honra da mulher em manipulação, provocação e desamparo, ou qualquer outra distorção da verdadeira submissão bíblica.
Então o que Paulo fez em Efésios 5 (como vimos semana passada) foi um chamado para a restauração da ideia original de Deus. Ele não aboliu o que Deus criou no princípio. Ele quer trazer isso de volta: a verdadeira liderança bíblica e a verdadeira submissão bíblica. Aqui está a forma como definimos essas duas realidades em nosso estudo semana passada:
- Liderança é o chamado divino para que o marido assuma a responsabilidade primária de ser como Cristo, um servo liderando, protegendo e provendo a sua casa.
- Submissão é o chamado divino para que a mulher honre e apoie a liderança de seu marido e o auxilie nessa tarefa de acordo com os seus dons.
Quando um marido lidera como Cristo e a esposa responde como a noiva de Cristo, há uma harmonia e uma mutualidade que é mais bela, mais satisfatória e mais frutífera do que qualquer outro modelo de casamento criado pelo homem. Deus ama o seu povo e ama a sua glória. E assim, quando seguimos o seu ideal de casamento, somos mais satisfeitos e Ele é mais glorificado.
O teste real para sabermos se compreendemos isso
Assim, eu penso que o teste real para sabermos se compreendemos a essência bíblica da masculinidade e da feminilidade e se concebemos isso como verdadeiro e belo – é se a aplicação de Paulo desse ensino para a vida da igreja nos surpreende e ofende ou não. Se os papéis do Novo Testamento para o homem e a mulher no casamento não são fundamentados em orgulho pecaminoso nem nas expectativas culturais, mas no desígnio original de Deus para a criação, então, como você esperaria que esse desígnio original se expressasse na vida da igreja? Isso é o que temos hoje diante de nós em 1 Timóteo 2:11-14.
Olhemos para esses impopulares versos e os ouçamos por alguns minutos, para vermos se a história que eles contam é realmente tão pouco atraente como muitos pensam.
11 A mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão.
12 E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio.
13 Porque, primeiro, foi formado Adão, depois Eva.
14 E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão.
Acho que o que precisamos fazer para entender a submissão nesse texto é pensar pacientemente no significado de “silêncio” (“esteja, porém, em silêncio”), no significado de “ensino” (“não permito que a mulher ensine”) e no significado de “autoridade” (“nem exerça autoridade de homem”). Então vejamos cada uma expressão por vez:
- “Silêncio”
Primeiro, “silêncio”. Verso 11: “A mulher aprenda em silêncio”. Note que a palavra “silêncio” é usada duas outras vezes em versículos próximos.
A palavra aqui para silêncio (hesuchia) é usada anteriormente no versículo 2 deste capítulo (hesuchion). Mas lá ela se refere à vida “quieta” que todas as pessoas piedosas devem seguir. “Orem… para que vivamos vida quieta e tranquila, com toda piedade e respeito”. Isso te dá o tom e a extensão da palavra. Ela não se refere a um absoluto silêncio: uma vida tranquila e “quieta” não é uma vida de total silêncio. É uma vida tranquila, serena e contente. O silêncio então, não parece ser total. É mais parecido com o que chamaríamos de “quietude”.
Então, que tipo de quietude Paulo tem em mente? É o tipo de quietude que respeita e honra a liderança dos homens que Deus chamou para liderarem a igreja. O verso 11 diz que a quietude deve ser “em toda submissão”, e o verso 12 diz que a quietude é oposta a “exercer autoridade sobre os homens”. Então o ponto não é se uma mulher não diz nada, mas se ela é submissa e se ela apoia a autoridade dos homens que Deus chamou para liderarem a igreja. Quietude significa falar de uma maneira que não comprometa tal autoridade.
Em instantes voltaremos a esse assunto para sermos mais específicos sobre o que é essa submissão.
- “Ensino”
A segunda coisa que devemos analisar é a referência ao ensino no verso 12. Quão extensiva é a proibição de Paulo quando ele diz, “não permito que a mulher ensine”?
Para responder essa pergunta, uma coisa que podemos fazer é olhar para outros lugares onde Paulo em que fala sobre mulheres ensinando. Por exemplo, em Tito 2:4 ele diz que as mulheres idosas devem ensinar as mais novas: “a fim de instruírem as jovens recém-casadas a amarem aos maridos e a seus filhos”.
Outro exemplo é 2 Timóteo 3:14 onde Paulo fala para Timóteo se lembrar de quem ele aprendeu as Escrituras. E as pessoas que ele tem em mente (podemos dizer pelo texto de 2 Timóteo 1:5) são Loide e Eunice, a avó e a mãe de Timóteo (o seu pai era um não crente ou um judeu [Atos 16:3]).
Outro exemplo é Priscila. Em Atos 18:26 registra: “Ouvindo-o [Apolo], porém, Priscila e Áquila, tomaram-no consigo e, com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus”.
Então, não é provável que Paulo esteja dizendo em 1 Timóteo 2:12 que todo tipo de ensino é proibido às mulheres. Existem exemplos de mulheres ensinando às mais jovens, ensinando crianças, e, em certo sentido, se unindo aos seus maridos para darem instruções privadas quando alguém está confuso ou desinformado como Apolo.
Esses são apenas alguns exemplos. É possível, então, generalizar o que Paulo tem em mente aqui quando diz: “não permito que a mulher ensine”? Eu acho que o mais seguro é deixar a próxima frase nos guiar. A próxima frase é, “… nem exercer autoridade sobre homem.” “Não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade sobre homem”.
Ao invés de permitir que a palavra “ensine” signifique qualquer coisa que queremos ou pensemos que ela seja, é mais seguro dizer que provavelmente ela signifique um tipo de ensino que de alguma forma se relaciona com autoridade. Ensinar e exercer autoridade são atividades que vão juntas. Assim, pelo menos algo que podemos dizer sobre o ensino das mulheres, é que Paulo o proíbe quando é, em parte, o exercício de autoridade sobre homens.
Isso nos leva à terceira questão, o que é essa “autoridade” referida no versículo 12?
- “Autoridade”
A chave que abre essa porta é uma observação muito interessante. Quando você lê o restante de 1 Timóteo que fala sobre o papel dos presbíteros na igreja, o que você encontra é que os presbíteros possuem basicamente duas responsabilidades: eles devem governar e ensinar. Você pode ver isso nas qualificações em 1 Timóteo 3:1-7, mas o lugar mais fácil para ver isso é em 1 Timóteo 5:17, “Devem ser considerados merecedores de dobrados honorários os presbíteros que presidem bem, com especialidade os que se afadigam na palavra e no ensino.”
Os presbíteros lideram e governam e os presbíteros ensinam ou pregam. De volta a Atos 20:28, você pode se lembrar, os presbíteros na igreja em Éfeso foram chamados pelo Espírito Santo e se tornaram “bispos”, e encarregados de pastorearem o rebanho, isto é, de ensinar todo o conselho de Deus.
Eu não penso que seja coincidência que o ensino de Paulo em 1 Timóteo 2:12 seja ele não permitir que a mulher ensine ou exerça autoridade sobre os homens. Ele, em essência, está dizendo: eu não permito que as mulheres preencham o ofício dos presbíteros na igreja. Os presbíteros são encarregados com a liderança e a instrução da igreja.
Esse é um resumo da função deles. Então, quando Paulo coloca essas duas coisas juntas e diz, “eu não permito que a mulher ensine nem que exerça autoridade”, o sentido mais natural é, “eu não permito que a mulher assuma o ofício de presbítero na igreja.”
Então a autoridade que Paulo tem em mente em 1 Timóteo 2:12 é a autoridade dos presbíteros. E como deve ser essa autoridade? Bom, vimos de Jesus em Lucas 22:26 como ela deve ser: “o maior entre vós seja como o menor; e aquele que dirige seja como o que serve.” Paulo diz em 2 Coríntios 10:8; 13:10 que Deus concedeu a ele autoridade na igreja não para destruição, mas para a edificação. E Pedro diz aos presbíteros das igrejas (1 Pedro 5:3), “nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos do rebanho.”
Em outras palavras, a autoridade dos presbíteros é uma autoridade de servos. É por isso que o ensino está no coração desse chamado. A autoridade dos presbíteros é exercida por persuasão – por ensino – não por coerção ou manobras políticas. Dessa forma, o ensino é o instrumento primário de liderança na igreja.
Definindo autoridade e submissão
Eu acho que seria proveitoso dar um passo atrás, para tentarmos fazer com o conceito de autoridade e submissão na igreja o que fizemos com os conceito de liderança e submissão nas casas, ou seja, dar uma nítida definição de cada uma:
- “Autoridade” se refere ao chamado divino de homens espirituais e dotados para assumirem a responsabilidade primária de presbíteros servindo como Cristo na liderança e ensino da igreja.
- “Submissão” se refere ao chamado divino para o resto da igreja, tanto homens como mulheres, para honrarem e confirmarem a liderança dos presbíteros e de serem preparados por eles para as centenas de diversos outros ministérios oferecidos aos homens e mulheres no serviço de Cristo.
E esse último ponto é muito importante. Para homens e mulheres que possuem um coração para servir – para salvar almas, curar vidas destruídas, resistir ao mal e servir às necessidades – existem infindáveis campos de oportunidades. Deus quer que toda a igreja esteja mobilizada em serviço, tanto homens como mulheres. Ninguém deve ficar em casa assistindo novelas e reprises enquanto o mundo está em chamas. E Deus quer preparar e mobilizar os santos através de um grupo de homens que possuem a responsabilidade principal de liderar e ensinar na igreja.
Apelo final
Existem muitas vozes hoje que clamam para conhecer uma forma melhor de preparar e mobilizar os homens e as mulheres da igreja para servir. E eu recomendo a vocês nessa manhã, com todo o meu coração, o significado claro desses versos:
- Que a masculinidade e a feminilidade se entrosam melhor no ministério quando os homens assumem a responsabilidade primária da liderança e ensino na igreja.
- Que a masculinidade e a feminilidade são mais preservadas, mais nutridas, mais realizadas e mais frutíferas nessa ordem da igreja do que em qualquer outra.
Eu recomendo esta verdade a vocês, para a sua fé, para o seu comportamento, porque:
- Essa é a forma que as Escrituras nos ensinam a organizar a igreja,
- E Deus inspirou as Escrituras,
- E Deus é bom.
[1] Extraído de <https://www.desiringgod.org/messages/manhood-womanhood-and-the-freedom-to-minister>
Traduzido por Bruno Vasconcellos de Castro Melo
Revisado por Ewerton B. Tokashiki
Sobre o autor: John Piper
John Stephen Piper, conhecido como John Piper, (Chattanooga, 11 de janeiro de 1946) é um teólogo e pastor batista fundador e professor do desiringGod.org e chanceler do "Bethlehem College & Seminary" em Minneapolis, Minnesota, além de aclamado escritor calvinista. John Piper ensinou Estudos Bíblicos na Bethel University por seis anos (1974-1980) e então serviu como Pastor para Pregação e Visão da Bethlehem Baptist Church em Minneapolis, Minnesota, por 33 anos (1980-2013). Seus livros incluem "Spectacular Sins", vencedores do ECPA Christian Book Award,[4] "What Jesus Demands from the World", Pierced by the Word, e "A Paixão de Deus por Sua Glória", e os best-sellers "Não jogue sua vida fora" e "A Paixão de Jesus Cristo". A organização Desiring God recebeu o nome de seu livro "Desejosos de Deus: Meditações de um hedonista cristão" (1986)