Discurso de posse do presidente do Supremo Concílio da IPB
Por: Boanerges Ribeiro
Permiti que vos diga uma palavra de fé.
Somos presbíteros desta Igreja. Presbíteros docentes; presbíteros regentes. Somos presbíteros pela vocação divina, na chamada do Espírito Santo, reconhecida pela Igreja do Senhor e estabelecida no ato solene da ordenação, em nome da Santíssima Trindade.
Ao sermos ordenados perguntaram-nos aqueles que constituíam o Presbitério que nos ordenava, fosse Conselho local ou Presbitério regional, se aceitávamos as Sagradas Escrituras como a Palavra de Deus e única regra infalível de fé e prática, ao que respondemos que sim. Aliás, não poderíamos responder que não. Perguntaram-nos, também, se aceitávamos os Símbolos de Fé da Igreja Presbiteriana do Brasil como uma exposição sistemática fiel do ensino das Sagradas Escrituras. Em perfeita e sã consciência respondemos que sim e se assim não tivéssemos respondido não teríamos sido ordenados presbíteros. Em seguida perguntaram-nos se aceitávamos e se poríamos em prática a Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil, havendo também recebido de nós resposta afirmativa. Em meu caso pessoal isso já foi há algum tempo. Eu tinha pouco mais que 22 anos de idade. No caso dos meus companheiros, em circunstâncias variáveis e em lugares diversos.
Esses Presbitérios jogavam em nossa honradez, na seriedade de nossa palavra. Quando aceitavam nossos votos, faziam-no em uma honrada confiança, porque eram integrados por homens honrados também, e não conviria a homens honrados negarem confiança a outros que de boa fé compareciam perante eles para proferirem os votos sagrados da ordenação.
A Constituição da Igreja Presbiteriana do Brasil não é a Palavra de Deus, infalível. Ela é trabalho humano que pode ser alterado, desde que o seja pelos meios estabelecidos na própria Constituição.
A Confissão de Fé e os Catecismos não são Palavra de Deus. Eles podem ser reformulados pelos meios estabelecidos na Constituição da Igreja. Contudo, aqueles Presbitérios aceitaram nossos votos de que nós os subscrevíamos e os praticaríamos, entendendo, evidentemente, que só admitiríamos a sua alteração pelos processos constitucionais vigentes. Aqui assumimos a Presidência do Supremo Concílio; meus companheiros assumem a Vice-Presidência e as Secretarias, na força e na segurança daqueles votos de ordenação.
Os senhores têm diante dos senhores os mesmos homens honrados que foram ordenados presbíteros há dez, vinte e trinta anos atrás e declararam aceitar a Palavra de Deus como única regra de fé e prática, e não entendem uma Igreja Presbiteriana do Brasil que apostate dos ensinos das Escrituras Sagradas.
Os senhores têm diante dos senhores um grupo de homens que aceita os Símbolos de Fé da Igreja Presbiteriana, acata a Constituição, pratica-a e a praticará. Nós jamais fomos infensos à compreensão e ao entendimento com nossos irmãos, ainda aqueles que de nós divergissem em qualquer ponto. Não fomos atingidos, em ocasião alguma, por ofensa pessoal alguma. De maneira alguma, em nenhuma ocasião dominou-nos ressentimento pessoal, seja da parte do Presidente ou de qualquer de seus companheiros de Mesa.
Contudo, meus irmãos, (não creio que fosse necessário dizê-lo, mas perdoai se o repito), a Mesa que elegestes, vós a elegestes porque a conheceis e conheceis os seus compromissos e a segurança com que está disposta a cumpri-los. Ela os cumprirá com toda certeza.
Não há, na Igreja Presbiteriana do Brasil, lugar para insubordinação que desborde daqueles planos de lei que nós aceitamos com liberdade. Ninguém nos obriga a ser presbiterianos. Mas, se queremos sê-lo, sejamo-lo honradamente. Ninguém nos obriga a aceitar a Constituição da Igreja. Mas, se prometemos aceitá-la e acatá-la, sejamos honrados e cumpramos esses votos da ordenação. Ninguém nos obriga a aceitar esses Símbolos de Fé. Mas, se os aceitamos; se, ao ser ordenados declaramos aceitá-los, sejamos honestos.
Sejamos, além de homens de Deus, simplesmente homens e cumpramos esses votos de ordenação.
Esta Igreja é uma Igreja aberta, na qual entram todas as pessoas que estão dispostas a assumir os compromissos da iniciação. Na qual, uma vez eleitos, são ordenados todos os oficiais que proferem os votos de ordenação.
Contudo, é uma Igreja aberta a pessoas que saibam cumprir os seus votos. Esta Igreja não é horda. Esta Igreja não é caterva. Ela é povo: Povo de Deus, organizado. Ela tem lei. Não é Legalista, mas tem lei. Não lei imposta por alguém, mas, lei que nós livremente aceitamos em sã consciência, sem que ninguém a isso nos obrigasse.
Essa lei é uma das expressões da graça de Deus. Não nos é imposta por poder arbitrário e estranho, mas nós mesmos, para que possamos ser povo, para que possamos viver juntos e juntos servir a Deus e somar nossas forças, nós mesmos é que a aceitamos e a praticamos com liberdade.
Esta Mesa não tem poderes, exceto os poderes da Constituição. Não tem autoridade, exceto aquela que vem da persuasão, que se dirige a homens livres como nós, e que apresenta argumentos razoáveis, que possam ser aceitos.
Esses elementos, contudo, sempre são usados. Porque, meus irmãos, durante o presente quadriênio esta Igreja continuará a ser Igreja e não se transformará em horda solta, desbordando pelos quatro cantos ao furor das paixões desaçaimadas.
Ela tem governo. Esse governo é a presença do Senhor entre nós. Ele se expressa na Palavra do Senhor que todos abrimos e acatamos. Ele se expressa em nossos Símbolos de Fé e nossa Constituição, nas deliberações de nosso Concílio Superior e dos Concílios Inferiores.
Nossa Igreja se encontra na voragem de um mundo em que organizações muito mais antigas, estáveis, se desfazem ou ameaçam desfazer-se com grande rapidez, ou começam a desfazer-se com grande rapidez.
Não possuímos meios de coação. A Igreja, graças a Deus, não tem poder de polícia. A única coisa que mantém a coesão da Igreja de Deus é a presença do Santo Espírito, e a honestidade daqueles que integram seu Ministério e seu Presbiterato.
Nesta reunião do Supremo Concílio, como neste quadriênio, serviremos a Igreja com alegria, com segurança; com a dedicação que o Senhor colocar em nós, nós a serviremos cada dia, todos nós da Mesa.
Mas não desejamos que haja ilusão em alguém, imaginando que o fato de estarmos sempre abertos à compreensão, à exposição do que ocorre, significa que haverá concessões doutrinárias e que haverá concessões à insubordinação e à desordem.
Não houve e não haverá.
Muito obrigado, meus irmãos, pelo seu voto, pela sua presença e pelo trabalho que, juntos, aqui faremos.
Jornal Brasil Presbiteriano, Ano XIII, nº 08, agosto de 1970, p. 3
Revisado por Ewerton B. Tokashiki
Fonte: Seminário JMC
Sobre o autor: Boanerges Ribeiro
Graduou-se Bacharel em Teologia pelo Seminário Presbiteriano de Campinas, em 1941, tendo ainda obtido licenciatura em Filosofia, mestrado e doutorado em Ciências Sociais.
Foi pastor da Igreja Presbiteriana do Brás, em São Paulo-SP, tendo sido, a partir daquele pastorado, fundador de 17 outras igrejas na Capital do Estado. Numa delas, a Igreja Presbiteriana do Calvário, no bairro do Campo Belo, exerceu o pastorado durante mais de 30 anos, recebendo o título de pastor emérito, ficando ali até o final de sua vida. Também foi pastor em uma Igreja Presbiteriana, de membros norte-americanos, em Saint Louis, Michigan, nos Estados Unidos da América.
Atuou como professor universitário, em várias instituições, incluso o seminário onde estudou e recebeu a graduação em Teologia. Como representante da Igreja Presbiteriana do Brasil, atuou em congressos e encontros nacionais e internacionais. Foi Preletor do Sínodo Reformado Ecumênico, em Sydney, e da Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana na América, em Jackson, Mississipi, EUA.
Como conferencista e orador religioso, contam-se inúmeros pronunciamentos, muitos deles publicados na imprensa presbiteriana.
Dentre suas atividades foi o fundador da Casa Editora Presbiteriana, a que dirigiu entre 1947 a 1961. Também foi o idealizador do Jornal Brasil Presbiteriano, em 1964, tendo sido, ainda, o seu 1º diretor.
No campo administrativo-educacional, foi membro dos Conselhos Deliberativos do Instituto Mackenzie, Presidente do Instituto Mackenzie e Chanceler da Universidade Mackenzie. Também idealizou e foi diretor da Fundação Educacional Presbiteriana Rev. José Manoel da Conceição (Fundação JMC), dentre outros.
Na década de 90, recebeu da Câmara Municipal de São Paulo o título de Cidadão Paulistano.
Exerceu o cargo de Presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, entre 1966 e 1978, em três mandatos de 4 anos.